Afinal, você deve ou não deve beber leite? Confira as respostas mais recentes da ciência!
O leite, incluindo derivados, figura como o principal alimento ingerido pelos humanos, é o que diz a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Segundo a FAO, para garantir a demanda mundial, cerca de 280 milhões de vacas leiteiras distribuídas pelo planeta produzem mais de 650 bilhões de litros de leite anualmente, movimentando uma economia gigantesca, que beneficia desde pequenos produtores a indústrias multinacionais.
Além dos aspectos econômicos, o leite também é um alimento rico em nutrientes, o que torna bastante justificável o seu consumo. Porém, será que este hábito alimentar que acompanha a humanidade há milênios deve ser mantido?
Confira as opiniões mais recentes dos cientistas!
Fonte de cálcio
Além das preferências pessoais, uma das principais justificativas para o consumo de leite está na grande concentração de cálcio que o alimento apresenta. Ora, é amplamente aceito que quem ingere mais cálcio tem ossos mais fortes, o que diminuiria o risco de fraturas. Sendo assim, a lógica diz que quanto mais leite uma pessoa beber melhor estrutura óssea ela terá, o que é parcialmente verdadeiro.
De fato, segundo a nutricionista clínica Sophie Medlin, do King’s College, de Londres, a ingestão de leite é importante para o desenvolvimento ósseo das crianças — o Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido recomenda que crianças entre um e três anos consumam cerca de meio litro de leite por dia, o que ofereceria a quantidade aproximada dos 350 miligramas de cálcio diários que uma criança deve ingerir. Além disso, o valor da ingestão de cálcio proveniente do leite permanece até a adolescência, diz Ian Givens, especialista em Nutrição da Universidade de Reading, na Inglaterra. “Se você não obtiver o desenvolvimento ósseo correto na adolescência, corre um risco maior de fraqueza óssea mais tarde, especialmente para as mulheres após a menopausa, que perdem os benefícios do estrogênio”, considera Givens.
Portanto, há um consenso entre os cientistas quanto ao valor da ingestão do leite da infância à adolescência. Porém, esta harmonia não permanece quando a abordagem recai sobre adultos.
Controvérsia entre adultos
De acordo com Sophie Midle, consumir leite na idade adulta parece não diminuir o risco de fraturas e pode ocorrer exatamente o oposto. Um estudo liderado pelo professor Karl Michaëlsson, do Departamento de Ortopedia da Universidade de Uppsala, na Suécia, aumenta a controvérsia em torno do consumo de leite ao relacionar maiores taxas de mortalidade e do risco de fraturas à ingestão de três ou mais copos de leite diários entre mulheres, que foram acompanhadas dos 50 aos 70 anos.
Por outro lado, sustentando as divergências, Midle destaca que existem muitos outros nutrientes no leite e nos laticínios. “Leite e alimentos lácteos também são uma grande fonte de todos os aminoácidos essenciais, que são as pequenas moléculas de proteína que constroem os músculos e reparam os danos nos tecidos”, ela diz. A nutricionista ressalta ainda que, além do cálcio e das proteínas, o leite também contém potássio, magnésio, fósforo, riboflavina, vitaminas A e B12, entre outros nutrientes, cujas quantidades diárias podem ser diminuídas se a dieta láctea for substituída por outros alimentos.
Mas os desencontros de opiniões entre os cientistas não param por aí. Para cada oposição ao consumo de leite por humanos há uma resposta contrária, que é sustentada pela falta de evidências suficientes para condenar o consumo de lácteos. As pesquisadoras Veronique Chachay e Marina Reeves, da Universidade de Queensland, na Austrália, relacionaram os pontos e os contrapontos mais frequentes, que incluem temas como o riscos de doenças crônicas e de cânceres, envelhecimento precoce, presença de hormônios e outras controvérsias relacionadas ao leite. Para grande parte dos riscos apresentados, as pesquisadoras apresentam argumentos contrários.
Clique aqui para mais detalhes sobre Chachay e Reeves apuraram.
Lactose, a vilã
O açúcar contido no leite, denominado lactose, para passar através das paredes do intestino e chegar à corrente sanguínea precisa ser quebrada por uma enzima chamada lactase. Segundo a nutricionista Sophie Midle, os humanos produzem grandes quantidades de lactase quando são bebês, o que permite que o consumo do leite materno ocorra. Entretanto, a especialista observa que em populações onde o consumo de leite tem sido historicamente baixo, como as do Japão e da China, a maior parte das crianças para de produzir lactase logo após o desmame. Assim, populações quase inteiras acabam desenvolvendo a chamada intolerância à lactose, que ocorre entre pessoas incapazes de absorver o açúcar.
Por outro lado, Midle destaca que em países onde o consumo de leite sempre foi alto, como nos europeus, a maioria dos adultos continua a produzir lactase por toda a vida e pode digerir o leite de forma bastante satisfatória, com apenas 5% da população sendo intolerante à lactose. “Continuar produzindo lactase na idade adulta é, na verdade, uma variação genética herdada que se tornou tão comum porque ser capaz de tolerar o leite tem uma vantagem seletiva. O leite é uma fonte útil de proteína, energia, cálcio, fosfato, vitaminas B e iodo, o que significa que aqueles que passaram pela mutação (que gera a tolerância à lactose) se tornaram geralmente mais saudáveis e produziram mais filhos do que aqueles que não toleravam o leite. Portanto, a presença da mutação aumentou”, explica.
Questão ambiental
Outra justificativa contrária ao consumo de leite que precisa ser considerada se apoia na causa ambiental. Afinal, reconhecidamente, a atividade pecuária é uma grande fonte de emissão de gases de efeito estufa e exige grandes áreas de pastagens para o rebanho bovino.
Segundo a FAO, o mundo hoje mantém uma população de mais de 1 bilhão de cabeças de bovinos, sendo que cerca de 28% desse total é composto por vacas leiteiras, o que torna a contribuição da atividade importante para o aquecimento global. Por outro lado, o avanço tecnológico de criação intensiva e de soluções para digestão bovina — como a que incluem o uso de carvão na alimentação do rebanho — tem apresentado resultados na diminuição do impacto ambiental que a atividade gera, o que pode minimizar o problema, caso as inovações sejam adotadas em médio prazo.
Mas, afinal: você deve ou não deve beber leite?
De acordo com a nutricionista Sophie Midle, quando se trata de saúde, o resultado final é que, como adultos, provavelmente não precisamos de laticínios em nossas dietas. “Mas o leite e os alimentos lácteos são convenientes e de bom valor, além de fornecerem muitos nutrientes essenciais que são mais difíceis de obter de outros alimentos. Onde beber leite é a norma cultural, nós nos adaptamos para tolerar muito bem e pode ser muito nutritivo”, ela considera.
Para as pesquisadoras Veronique Chachay e Marina Reeves, por sua vez, a dúvida sobre a ingestão de leite precisa ser ampliada para temas mais específicos, que devem incluir as seguintes questões:
- Quais laticínios são mais adequados para você e quanto deles devem ser incluídos na sua dieta?
- Os produtos lácteos fermentados ou não fermentados são melhores para você?
- Se você não tolera alimentos lácteos, como pode receber os mesmos nutrientes valiosos de outros alimentos?
As pesquisadoras destacam que, como alternativa ao leite, uma dieta à base de plantas – que inclua soja, amêndoa, aveia, arroz e coco, por exemplo – tem perfil nutricional diferente e pode ser fortificada para compensar os nutrientes que faltarem. Segundo Chachay e Reeves, embora ensaios clínicos que medem as implicações de longo prazo para a saúde permaneçam escassos, o consumo de laticínios está associado a uma dieta de maior qualidade, mas pode ser substituído, se houver necessidade.
Portanto, se forem adequados à sua fisiologia, o leite e os derivados ajudarão você a atender às recomendações diárias de nutrientes para uma saúde ideal. De qualquer forma, qualquer que seja a sua escolha — de manter ou de descartar o leite da sua alimentação —, não tome nenhuma decisão sem antes consultar o seu médico ou um nutricionista, que são os profissionais capacitados para garantir que você tenha uma alimentação adequada ao seu perfil.