Especialista explica por que o uso de máscara continua sendo necessário mesmo após as duas doses da vacina
Pouco mais de dois meses após a festiva — e, talvez, precipitada — declaração do presidente norte-americano Joe Biden, que, em 14 de maio, comemorou a possibilidade de as pessoas totalmente imunizadas deixarem de usar máscaras nos Estados Unidos, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) do país deu um passo atrás e, em 27 de julho, voltou a recomendar que mesmo as pessoas vacinadas com todas as doses se mascararem novamente. A recomendação dá ênfase para quem vive em áreas onde as taxas de infecção pela Convid-19 permanecem elevadas.
Em entrevista ao site The Conversation, o médico Peter Chin-Hong, especialista em doenças infecciosas da Universidade da Califórnia, explicou as mudanças no que diz respeito ao uso de máscara, mesmo após a vacinação.
A ciência por trás da máscara
Para sua explanação, Chin-Hong partiu do princípio já bastante difundido que estabelece que a máscara, literalmente, compõe uma camada física de proteção que de um lado coloca quem usa e do outro qualquer vírus que esteja no ar. Assim, as máscaras ajudam a impedir a disseminação do coronavírus.
“O motivo pelo qual as autoridades de saúde pública estão pedindo para que as máscaras sejam mais usadas é que há evidências claras e crescentes de que – embora raras – infecções por Covid-19 podem ocorrer em pessoas que estão totalmente vacinadas . Isso é particularmente verdadeiro para as variantes emergentes de preocupação. A boa notícia é que a infecção, se acontecer, tem muito menos probabilidade de causar doenças graves ou morte em pessoas vacinadas”, explica o médico.
Porém, o especialista ressalta que, com mais vírus circulando na comunidade, com taxas de vacinação mais baixas e com mais variantes altamente transmissíveis, as condições de propagação do vírus também aumentam. “Se as pessoas vacinadas podem ser infectadas com o coronavírus, elas também podem transmiti-lo . Daí a indicação do CDC para que as pessoas vacinadas permaneçam mascaradas em espaços públicos fechados, ajudando a interromper a transmissão viral”, recomenda.
Altas taxas de infeção
O CDC estabeleceu como alvo da campanha pelo retorno do uso de máscara áreas nos Estados Unidos que tenham 50 novas infecções por 100 mil residentes ou que tiveram mais de 8% dos testes positivos durante a semana anterior “Pelas próprias definições do CDC, a transmissão ‘substancial’ na comunidade é de 50 a 99 casos de infecção por 100 mil pessoas por semana, e ‘alta’ é 100 ou mais”, explica Chin-Hong.
Só para termos uma ideia da posição de Belo Horizonte nessa referência, em 3 de agosto, a capital registrou 244,1 novos casos por 100 mil habitantes no espaço de 14 dias, o que daria 122 novos caso em uma semana
Protegendo o outro
De acordo com Chin-Hong, a recomendação para que pessoas totalmente vacinadas continuem usando máscaras tem como objetivo principal proteger os não vacinados, o que, no nosso caso, no momento, inclui quase 80% da população brasileira e 70% da população belo-horizontina. “O CDC recomenda ainda o mascaramento em público para pessoas vacinadas com membros da família não vacinados, independentemente de taxas de transmissão da comunidade local”, ressalta o médico.
Segundo o especialista, pessoas não vacinadas correm risco substancialmente maior de se infectarem e de transmitirem o SARS-CoV-2 e de desenvolverem complicações com o Covid-19.
A ameaça da delta
Em sua entrevista, Peter Chin-Hong destacou que dados preliminares sugerem que a disseminação de variantes como o delta pode aumentar a chance de infecções repentinas em pessoas que receberam apenas a primeira dose da vacina. “Por exemplo, um estudo descobriu que uma única dose da vacina Pfizer teve uma eficácia de apenas 34% contra a variante delta, em comparação com 51% contra a variante alfa mais antiga em termos de afastamento de doenças sintomáticas”, observa.
Contudo, os dados são mais tranquilizadores para aqueles que foram totalmente vacinados. “Depois de duas doses, a vacina Pfizer ainda oferece forte proteção contra a variante delta, de acordo com dados do mundo real da Escócia e de vários outros países e em estudos preliminares do Canadá e da Inglaterra. Os pesquisadores observaram apenas uma diminuição modesta na eficácia contra doenças sintomáticas, de 93% para a variante alfa a 88% para delta”, diz o médico.
Segundo Chin-Hong, outros relatórios preliminares recentes de países altamente vacinados, como Israel e Cingapura se mostraram preocupantes. “Antes de a variante delta se espalhar, de janeiro a abril de 2021 , Israel relatou que a vacina Pfizer era 97% eficaz na prevenção de doenças sintomáticas. Desde 20 de junho de 2021, com a variante delta circulando mais amplamente, a vacina Pfizer foi apenas 41% eficaz na prevenção de doenças sintomáticas, de acordo com dados preliminares relatados pelo Ministério da Saúde de Israel no final de julho. Uma análise usando dados do governo de Cingapura demonstrou que 75% das infecções recentes por Covid-19 ocorreram em pessoas que foram pelo menos parcialmente vacinadas – embora a maioria delas não estivesse gravemente doente”, destaca.
O alento dado pelo médico está no fato de todos os relatórios e estudos demonstrarem que as vacinas continuam eficientes na prevenção de hospitalizações e de doenças graves devido à variante delta. Porem, o Chin-Hong reforça que os dados que estão sendo obtidos apoiam a recomendação da OMS para que mesmo indivíduos totalmente vacinados continuem a usar máscaras. Chin-Hong observar que, como a maior parte do mundo ainda tem baixas taxas de vacinação e usa uma variedade de vacinas com eficácias variáveis e também considerando que os países têm diferentes cargas de circulação do vírus SARS-CoV-2, esta é uma precaução ainda muito necessária.