Cidadania

A categoria dos inquilinos do não – por Diorela Kelles

por Diorela Kelles*

Descobri uma nova categoria de pessoas e me divirto tentando descobrir quem nela se encaixa, quem para ela está indo e quem dela está saindo. Falo das pessoas que nunca estão disponíveis para fazer nada que não seja delas ou para elas. Refiro-me às pessoas que habitam um lugar completamente controlado por elas mesmas e não se prestam a mudar isso nem por um dia.

São inúmeras as razões pelas quais as pessoas entram para esse grupo: timidez, cansaço, decepção etc. O fato é que entendi que as pessoas que caem nesse grupo dificilmente vão aceitar um convite para algo que possa provocar uma variação na vida. E como eu sou (ou era) uma pessoa de convites, isso me causava estranhamento. Até que parei.

Parei de convidar os inquilinos do não. Os eternos indisponíveis. Eles estão lá, morando em suas próprias razões. Entendi que é inútil forçar, mas sigo deixando as portas abertas, o que é bem diferente.

Recentemente fiz o teste de passar 10 dias sem convidar ninguém para nada. Estranhamente, foi a fase em que eu mais recebi convites, inclusive, lindos e inusitados! Convite para tomar café com leite diretamente da vaca, convite para trabalhos diferentes, convite para conhecer gente famosa, convite para caminhadas, convite para dar opinião!

Será que convidar demais estava me impedindo de ser convidada, me questionei? Não faz sentido. Pode ter sido apenas um retorno de anos de convites negados que gerei. Fato é que respondi “sim” para quase tudo que podia e, ao contrário do livro O ano do sim, de Shonda Rhimes, a mesma de Grey’s Anatomy, nem todo “sim” foi libertador para mim. Alguns me deram muita exaustão, mas nenhum deles me deu arrependimento, o que considero positivo.

Entendo a importância de falar “não”. Nos nossos encontros de vizinhos, este já foi um tema abordado mais de uma vez. Falar “não” é uma grande libertação, principalmente para a mulher. Mas morar nele não.

Criar uma redoma da sua própria vida e não prestigiar a sua comunidade com o que ela tem para oferecer gera um universo de bolhas muito rasas entre nós. O mundo se apeque- na. Um pouquinho de sim, um pouquinho de não. Isto seria o ideal. Incluindo uma pitada de convites próprios também.

Priorizar os seus projetos, mas não negar a existência e a sua importância para os projetos dos outros. Ser aplaudido e aplaudir. Ir aos lançamentos, às exposições dos amigos, às noites de vinho que não são feitas para você e até aos ve-lórios. De alguma forma, ser o coadjuvante também faz parte da construção da nossa história e da nossa sociedade.

 

*Redatora, advogada e atriz, Diorela é entusiasta do direito à cidade (@vistadacidade)